terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Artigo: Tempo de medo?

*Artigo publicado no Jornal Diário de Guarapuava dia 06 de dezembro de 2013 por ocasião da Campanha 16 dias de ativismo pelo fim da violência de gênero

“É o tempo do medo. Medo da mulher à violência do homem e medo do homem à mulher sem medo”, disse Eduardo Galeano


Pesquisas apontam que 1/3 das mulheres em todo o mundo sofrem de violência física ou sexual; a violência sexual é o tipo mais comum das violências contra a mulher e afeta 30% das mulheres em todo o mundo; e 38% das mulheres assassinadas no mundo foram mortas por seus parceiros íntimos. Considera-se a violência contra a mulher, portanto, uma epidemia global.
Pelo segundo ano consecutivo, ocorre, em Guarapuava, a campanha “16 dias de ativismo pelo fim da violência de gênero”, que acontece em mais de 135 países há mais de 18 anos e tem o objetivo de unir poder público, imprensa e sociedade civil no combate à violência. 
Considera-se violência de gênero aquela que é exercida de um sexo sobre o sexo oposto. Essa expressão é quase um sinônimo de violência contra a mulher, pois são elas as maiores vítimas. A lei 11.340/06, Lei Maria da Penha,  define violência doméstica ou familiar contra a mulher como sendo toda ação ou omissão, baseada no gênero, que cause morte, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral e patrimonial, no âmbito da unidade doméstica, da família e em qualquer relação íntima de afeto, em que o agressor conviva ou tenha convivido com a agredida.
A violência contra a mulher deve ser entendida como uma ação que transforma diferença em desigualdade de poder com o fim de dominar, explorar e oprimir. A mulher que sofre essa dominação é tratada  como “objeto” e não como “sujeito”, torna-se alguém sem voz, dependente e passivo. Por isso, muitas mulheres não têm coragem suficiente para denunciar, e acabam perdendo sua autonomia, sua liberdade, sua capacidade de pensar, querer, sentir e agir. A violência contra a mulher pode se manifestar de várias formas e com diferentes graus de severidade. Estas formas de violência não se produzem isoladamente, mas fazem parte de uma sequência crescente de episódios, do qual o homicídio é a manifestação mais extrema.
A ideologia machista, que é a base da violência contra as mulheres, é enraizada socialmente. Ensina-se, desde muito cedo, que o homem deve ter o mando da relação, que as mulheres devem se submeter ao “poder do macho”. A violência contra as mulheres resulta dessa proliferação de ideias machistas. Assim, porque se é macho, julga-se no direito de espancar o sexo oposto. Educada que foi para submeter-se aos desejos masculinos, a mulher toma este “destino” como natural, submetendo-se à violência não porque “consinta”, mas sim porque é forçada a “ceder”.
O Movimento de Mulheres da Primavera tem feito importante trabalho para a visibilidade e a compreensão da violência contra a mulher em Guarapuava. Os mapeamentos das queixas, os debates sobre a posição da “vítima” e as investigações sobre os sistemas policial e judiciário são pautas constantes dos debates do Movimento.
Portanto, evidencia-se a importância de um espaço de escuta e de outras formas de lidar com a violência de gênero, como o que existe no Movimento de Mulheres da Primavera, que se mobiliza em torno da temática, implementando ações socioeducativas voltadas à atenção e ao cuidado de vítimas e também de agressores nos casos de violência doméstica, trazendo contribuições na busca da resolução dos conflitos de gênero.
Entretanto, a luta não acaba por ai. Movimentos sociais, coletivos feministas e de mulheres estão lutando para a superação das desigualdades de gênero e da violência contra a mulher. Mas, isso deve ser uma tarefa política de todos. E se as mulheres são alvo de resistência, preconceito ou piadas por conta destas lutas, é porque o tempo, como disse Galeano, ainda é de medo, e, principalmente, medo de muitos homens à mulher sem medo.
Nincia Cecilia Ribas Borges Teixeira
Pós-doutora em Ciência da Literatura. Doutora em Letras. Professora

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